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Combater nacionalismo da vacina será prioridade, diz nova chefe da OMC

Combater o chamado “nacionalismo da vacina” – em que países barram a exportação para imunizar primeiro seus habitantes – será prioridade para a economista nigeriana Ngozi Okonjo-Iweala, 66, que foi confirmada nesta segunda (15) diretora-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC). Seu mandato vai até 31 de agosto de 2025.

Ngozi, como prefere ser chamada, é a primeira mulher, a primeira africana e a primeira pessoa negra a dirigir a entidade, fundada em 1995 para impulsionar o livre comércio. Isso significa um “peso extra”, disse ela em entrevista após a confirmação de seu nome por consenso pelos membros da instituição: “Para realmente deixar orgulhosas as mulheres e os africanos, terei que entregar resultados, e é essa a minha meta”.

Citando o fato de ser “de fora” como uma das principais vantagens de sua escolha – “não faremos ‘business as usual’ [o mesmo de sempre], venho com um olhar fresco e vou apresentar soluções novas” -, Ngozi disse que pretende apresentar soluções concretas ainda em 2021, na reunião ministerial que deve acontecer até o fim do ano.

Uma das principais, afirmou, será negociar acordos entre fabricantes de vacina e países mais pobres para permitir o licenciamento de imunizantes e o aumento da produção. “Não vamos inventar a roda. A AstraZeneca já está fazendo isso e sabemos que a solução interessa a todos.” Segundo ela, um país que vacinar apenas sua população verá a doença voltar na forma de variantes que surgem nos vizinhos não protegidos.

Agora à frente de uma instituição com 164 membros, 650 funcionários , orçamento anual de US$ 220 milhões (R$ 1,8 bi), Ngozi falou sobre seus planos para os principais desafios da OMC. Veja alguns deles, na ordem de prioridade estabelecida por ela

Protecionismo

O problema

A ameaça do coronavírus levou governos a barrar a exportação de produtos médicos, entre outros, e há temor de que tarifas sejam usadas para proteger empresas nacionais na recuperação da crise pós-pandemia

O que diz Ngozi

Quer uma “terceira via”, em que empresas licenciem vacinas e medicamentos para aumentar a produção em países mais pobres, com alguma garantia de proteção à prioridade intelectual, para “não desincentivar a inovação e o investimento em pesquisa e desenvolvimento”.

No curto prazo, vai listar restrições e proibições em vigor e negociar suas reduções e garantir que elas tenham prazo limitado. No longo prazo, quer criar com outras organizações multilaterais um plano de reação a pandemias, “pois haverá outras e, quando elas vierem, não podemos perder tempo discutindo o que fazer”.

Mudanças climáticas e ambiente

O problema

Regras de comércio global são vistas como instrumentos para atingir os objetivos do Acordo de Paris, contra as mudanças climáticas, mas temas ambientais estão fora do escopo tradicional da entidade. Negociações para reduzir subsídios à indústria pesqueira que levam à sobrepesca e ao risco de extinção de espécies marítimas arrastam-se há 20 anos

O que diz Ngozi

É uma de suas principais metas de curto prazo apresentar um acordo concreto para a questão da pesca na reunião ministerial do fim do ano.

Acha importante reduzir a emissão de gás carbônico no transporte de bens, e diz que soluções mais verdes para a retomada são fundamentais mas devem ser implantadas de forma a não penalizar países em desenvolvimento. “Eles devem ver as ferramentas ambientais como fonte de receita, e não como barreiras aos seus produtos.”

Diz que tarifas como as que a União Europeia estuda impor para desestimular produtos menos sustentáveis ambientalmente são importantes, “mas têm que ser aplicadas e monitoradas para garantir justiça e não discriminarem países em desenvolvimento”.

Solução de controvérsias

O problema

O principal órgão para resolver disputas comerciais na OMC, chamado de órgão de apelação, está bloqueado há meses pela administração do ex-presidente americano Donald Trump, que impediu a nomeações de novos juízes

O que diz Ngozi

Espera retomar em breve as nomeações, mas quer uma reforma mais ampla do sistema de solução de controvérsias

Considerou válidas críticas de que o órgão de apelação está indo além de seu mandato: “Ele deve cuidar da disputa entre membros e não de criar jurisprudência”.

Criticou o atraso em decisões, que chegam a levar dois anos, quando o prazo máximo é 90 dias: “Os casos hoje podem ser mais complexos, mas precisamos rever a burocracia interna e ganhar eficiência”.

Pretende compilar as propostas já feitas e levar um plano de reforma à reunião ministerial.

?Comércio eletrônico

O problema

Não há regras específicas na OMC para o comércio eletrônico

O que diz Ngozi

Que a economia digital virou predominante, o crescimento do comércio eletrônico vai crescer e é preciso negociar regras multilaterais para ele. Segundo Ngozi, a área é importante também porque aumenta a inclusão de mulheres e de pequenas e microempresas no comércio global

Subsídios agrícolas

O problema

O acordo sobre agricultura da OMC, de 1995, visa conter subsídios e barreiras comerciais protecionistas, mas inclui concessões para evitar insegurança alimentar em países onde há risco alto de fome generalizada, como a Índia. Analistas consideram praticamente impossível que os indianos aceitem uma mudança nessa área

O que diz Ngozi

Acha importante discutir a redução de subsídios agrícolas, mas não considera possível obter resultados no curto prazo. “É uma área de importância crítica para muitos países, não apenas para os mais pobre, e as soluções não são fáceis. Mas vejo espaço para negociar, inclusive sobre a questão do algodão.”

Acordo comerciais

O problema

Desde 1993 a OMC não fecha um grande acordo comercial multilateral para reduzir tarifas ou outras barreiras comerciais.

Nesse vácuo, países partiram para acordos plurilaterais em várias áreas, como no comércio digital

O que diz Ngozi

Que acordos plurilaterais ou bilaterais têm inovações interessantes, mas os multilaterais têm o melhor custo-benefício, inclusive em relação à solução de disputas. Apontou a falta de confiança entre os membros como a principal barreira e disse que sua primeira ação em março será se reunir com todos os embaixadores para levantar suas questões

A questão chinesa

O problema

A capacidade de conter benefícios estatais a empresas chinesas que distorcem a concorrência no mercado global é o problema de maior impacto para a OMC, tanto do ponto de vista político quanto econômico.

Desde que aderiu à organização, 1999, o país asiático se beneficiou do arcabouço de livre comércio e se transformou na maior exportadora do mundo, mas manteve um modelo próprio de participação estatal na economia e não cumpriu as regras de transparência sobre subsídios industriais.

O livro de regras da OMC é considerado inadequado também para lidar com questões de propriedade industrial: empresas estrangeiras são forçadas a abrir mão de tecnologia sensível e know-how para investir na China ou entrar no mercado chinês.

EUA, União Europeia e Japão defendem uma nova lei de investimento que proíba a transferência forçada de tecnologia

O que diz Ngozi

A questão chinesa não foi levantada de forma específica durante a entrevista nem mencionada por ela em sua exposição. Falando de forma geral, Ngozi disse que a falta de confiança é um problema geral da OMC, não só entre grandes potências como os Estados Unidos e a China mas também entre países ricos e pobres.

Sobre o livro de regras, concorda com a necessidade de reformas e diz que levantará as sugestões dos membros para negociar saídas aceitas por todos.

Disse que vai reforçar mecanismos de monitoramento, inclusive digitais, para tornar efetiva a transparência dos membros

Tratamento preferencial

O problema

Num debate que também envolve a China, grandes economias discutem as concessões do sistema da OMC chamado de nação mais favorecida. Pela regra, cada membro deve aplicar a mesma tabela de tarifas a todos os outros membros, mas países menos desenvolvidos podem elevar suas tarifas, numa espécie de “tratamento café com leite”.

A OMC porém permite que os membros se autodesignem como “países em desenvolvimento”, e dessa lista fazem parte até hoje a Índia e a China (quinta e segunda maiores economias do mundo) – o que é uma das principais críticas americanas. No caso chinês, uma saída seria negociar que o governo chinês abra mão do status prefencial em troca de ter sua economia considerada como “de mercado” nas investigações sobre prática de dumping

O Brasil, que faz parte dos países em desenvolvimento, tem renunciado ao tratamento especial desde 2003

O que diz Ngozi

Não houve perguntas sobre o tema e ele não foi mencionado em sua exposição inicial

Outros temas

A entrevista se ateve a questões estruturais, mas uma disputa conjuntural deve ser um dos grandes testes para a propalada capacidade de negociação política da nova diretora: a decisão sobre se os Estados Unidos violaram as regras da OMC quando aumentaram unilateralmente as tarifas sobre aço e alumínio em 2018, invocando uma cláusula de segurança nacional.

Uma decisão a favor dos EUA avalizaria medidas unilaterais de outros membros, minando o projeto multilateral da OMC. Mas o veredito contrário atiça o vespeiro americano, que, em gestões passadas, acusou a entidade de intervenção indevida em sua soberania.

O governo Biden, declaradamente pró-multilateralismo, compartilha parte das críticas à entidade e já disse que vai priorizar o fortaleciimento da economia interna americana nesse começo de governo.

Fonte: Folha

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