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Tirando proveito da atual crise de saúde pública

Os líderes europeus que estão usando a pandemia para concentrar mais poder

Parte dos líderes europeus está tirando proveito da atual crise de saúde pública para reprimir dissidências e fortalecer seu poder.

Enquanto autoridades na Turquia prendem centenas de pessoas por postagens em redes sociais e na Rússia a população é ameaçada de prisão por qualquer publicação considerada notícia falsa, há temores de que a democracia esteja em risco na Polônia e já tenha sido varrida na Hungria.

A BBC pediu para seus correspondentes de cada região analisarem se a pandemia está sendo usada como desculpa para abuso de poder.

Debate semelhante acontece no Brasil. Neste fim de semana, o presidente Jair Bolsonaro participou de um ato que defendia a intervenção militar no país, provocando reações de políticos, como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e ministros do Supremo Tribunal Federal. “Nós não queremos negociar nada. Nós queremos ação pelo Brasil”, disse o presidente, em discurso que foi transmitido ao vivo em rede social.

“Invocar o AI-5 e a volta da ditadura é rasgar o compromisso com a Constituição e com a ordem democrática”, publicou no Twitter o ministro do STF Gilmar Mendes. No dia seguinte, Bolsonaro, que vem perdendo apoio, moderou o tom e falou em respeito ao regime democrátrico.

Hungria: “suicídio” do Parlamento confere poderes extraordinários a Orban

Análise por Nick Thorpe, correspondente em Budapeste

O poderoso primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban, foi apontado em seu país e no exterior de estar usando a crise do coronavírus para ganhar ainda mais poder, em vez de unir o país.

Primeiro, seu governo declarou estado de emergência no dia 11 de março, ganhando tempo valioso para se preparar para a pandemia.

Mas depois ele usou sua maioria parlamentar para estender o estado de emergência indefinidamente. O governo agora tem o poder de governar por decreto pelo tempo que for necessário e pode decidir quando o perigo acabará.

Críticos falam de fim da democracia na Hungria, mas o Ministro da Justiça insiste que a “Lei de Autorização” expirará ao final da emergência, e que é necessária e proporcional.

Viktor Orban no Parlamento húngaro.
Image captionO Parlamento húngaro, onde Viktor Orban tem a maioria, deu ao primeiro-ministro poderes especiais

É o fim da democracia? O especialista em direito constitucional Zoltan Szente adverte que a pandemia pode ser facilmente usada para manter os poderes extraordinários do governo.

Como é poder exclusivo do governo decidir quando encerrar o estado de emergência, Szente diz que o Parlamento realmente “cometeu suicídio” ao abrir mão de seu direito de controle sobre ele.

Em teoria, ainda existem três áreas de controle sobre o poder de Viktor Orban:

  • O Parlamento continua funcionando, a menos que a pandemia o impeça
  • O Tribunal Constitucional ainda está trabalhando
  • As eleições gerais estão agendadas para 2022

Mas o partido Fidesz, de Orban, tem maioria no Parlamento, e todos as votações foram adiadas até o final da emergência.

O Tribunal Constitucional já está repleto de pessoas próximas a Orban. O que pode atrapalhar o primeiro-ministro, contudo, é o Judiciário, que é amplamente independente.

O partido no poder precisa manter a maioria de dois terços no Parlamento para nomear um novo presidente da Suprema Corte no final de 2020. Caso isso aconteça, o poder de Orban será quase inexpugnável.

Turquia: a “oportunidade” para Erdogan

Análise de Orla Guerin, correspondente em Istambul

O combativo líder da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, não precisa usar a pandemia de coronavírus para usurpar o poder, porque ele já tem bastante. Essa é a opinião dos ativistas de direitos humanos no país.

Recep Tayyip Erdogan
Image captionPara ativistas, Erdogan não precisa usar o coronavírus para aumentar seu poder, porque já tem demais

“Existe um sistema tão centralizado que não é preciso obter mais poderes”, diz Emma Sinclair-Webb, diretora da Human Rights Watch para a Turquia.

No entanto, Sinclair-Webb acrescenta que houve uma tentativa oportunista de “sondar o terreno” com propostas para aumentar o controle sobre as empresas de redes sociais.

Elas foram “enterradas profundamente” em um projeto de lei que lida principalmente com medidas econômicas para amortecer o impacto do vírus.

O objetivo, explica, era “fortalecer as plataformas de redes sociais para sujeitá-las ao controle e à censura do governo”.

Os projetos de emendas foram retirados de repente, mas Sinclair-Webb tem a expectativa de que voltem no futuro.

A polícia multa as pessoas que violam as medidas de confinamento na Turquia
Image captionA polícia multa as pessoas que violam as medidas de confinamento na Turquia

O governo turco está determinado a controlar a narrativa durante a crise. Centenas de pessoas foram presas por “postagens provocativas” sobre a pandemia nas redes sociais.

Poucos médicos ousaram falar.

“Ocultar os fatos e criar um monopólio da informação infelizmente se tornou o modo como este país é governado”, diz Ali Cerkezoglu, da Associação Médica da Turquia. “Médicos, enfermeiros e profissionais de saúde se acostumaram a isso nos últimos 20 anos”.

O advogado Hurrem Sonmez teme que a pandemia seja uma oportunidade para o presidente Erdogan. “A sociedade e a oposição são mais fracas devido à pandemia”, diz Sonmez, que representou réus em casos de liberdade de expressão.

“Todo mundo tem o mesmo objetivo: A prioridade é sobreviver. Existe uma séria preocupação de que a situação possa ser mal utilizada por esse governo.”

Rússia: pandemia frustra as ambições de Putin

Análise de Steve Rosenberg, correspondente em Moscou

Em janeiro, o Kremlin achou que tudo havia funcionado.

A Constituição russa seria alterada, principalmente para permitir que Vladimir Putin pudesse permanecer por mais dois mandatos.

Em seguida, ele realizaria uma “eleição nacional” triunfante no dia 22 de abril para que os russos endossassem as mudanças. Os críticos do presidente classificaram como “golpe constitucional”, mas parecia um acordo fechado.

A pandemia, no entanto, colocou tudo em espera.

O presidente Putin teve que adiar a votação: afinal, como ele pode convocar as pessoas a votar em meio a uma pandemia?

O problema para o Kremlin agora é que aprovar uma nova Constituição pode ser a última coisa na cabeça dos russos.

As medidas de confinamento para combater o novo coronavírus estão destinadas a dizimar a economia, com previsões de uma recessão que pode durar dois anos e a perda de milhões de empregos.

Os russos tendem a culpar as autoridades e os burocratas locais, e não a autoridade central, por seus problemas do dia a dia.

Mas a história mostra que quando as pessoas aqui sofrem um sofrimento financeiro pessoal agudo, voltam sua raiva contra o líder de seu país. Esse sofrimento agora parece inevitável.

Vladimir Putin em uma reunião semanal com seu governo
Image captionOs apoiadores de Putin argumentarão que em momentos de crise o país precisa de uma liderança forte, segundo o correspondente em Moscou

Isso pode explicar por que o líder do Kremlin recentemente delegou poder aos governadores regionais para combater a pandemia – agora eles compartilham responsabilidades.

Os apoiadores do presidente Putin, incluindo a mídia estatal, argumentarão que, em uma crise nacional, a Rússia exige liderança forte e estável mais do que nunca; em outras palavras, que a era Putin deve ser estendida. Quanto aos críticos do Kremlin, eles já acusaram as autoridades de usar a pandemia para fortalecer o controle.

Uma nova lei aprovada pelo Parlamento impõe duras penas às pessoas condenadas por espalharem o que forem consideradas informações falsas sobre o coronavírus: multas equivalentes a US$ 25 mil ou até cinco anos de prisão.

Há preocupações sobre a implementação de sistemas de vigilância para reforçar a quarentena.

O confinamento também significa que os protestos da oposição não podem ocorrer: atualmente, as reuniões de massa são proibidas para impedir a propagação da pandemia.

Polônia: o governo está arriscando vidas para manter o poder?

Análise de Adam Easton, correspondente em Varsóvia

O partido no poder da Polônia está sendo acusado de colocar vidas em risco imprudentemente, pressionando as eleições presidenciais de maio durante a pandemia.

O presidente Andrzej Duda viu seu apoio aumentar nas pesquisas durante a pandemia e é claramente o favorito a vencer.

O partido no poder, Lei e Justiça, argumenta que é constitucionalmente obrigado a realizar eleições, e que votar pelo correio é a solução mais segura sob o confinamento.

Essa é sua opção preferencial, mas o partido também apoia uma proposta de mudar a Constituição para permitir que o presidente Duda sirva por mais dois anos, desde que ele não possa tentar depois uma reeleição.

Uma mulher vê o discurso discurso do presidente da Polônia na televisão
Image captionO presidente da Polônia, Andrzej Duda, se dirigiu a poloneses no começo do mês pelo aniversário do acidente de avião em que o presidente Lech Kaczynski morreu

A oposição diz que votar pelo correio coloca em risco os eleitores, os funcionários dos correios e os funcionários eleitorais. A comissão eleitoral da União Europeia e a da Polônia também expressaram preocupação em realizar as eleições.

Existe uma maneira legal de esperar, insiste a oposição: declarando um estado de desastre natural que proíbe as eleições enquanto medidas extraordinárias são aplicadas pelos próximos 90 dias.

O governo diz que declarar medidas extraordinárias o responsabilizará pelos pedidos de indenização.

Se as eleições forem realizadas em maio, elas não seriam justas, dizem grupos de direitos humanos, porque os candidatos suspenderam a campanha enquanto o titular ainda desfruta de ampla cobertura da mídia que ajuda o governo e ainda visita profissionais de saúde.

Se as eleições forem adiadas, a Polônia poderia estar no meio de uma recessão durante as eleições, o que diminuiria substancialmente as chances de reeleição de Duda. Se um candidato da oposição fosse escolhido, o poder de veto do novo presidente poderia alterar significativamente a capacidade do governo de impulsionar seu programa nos próximos três anos e meio.

“Este é um claro exemplo sobre como tirar o máximo proveito da crise e permanecer no poder”, disse à BBC Malgorzata Szuleka, advogada da Fundação Helsinski para os Direitos Humanos em Varsóvia.

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52358420

Foto: Image captionViktor Orban, primeiro-ministro da Hungria (esq), Vladmir Putin, presidente da Rússia e Recep Tayyip Erdogan, da Turquia; todos são vistos como ‘aproveitadores’ da crise da pandemia para aumentar seu poder

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