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Os preços devem subir menos em 2022 — mas custo de vida seguirá alto

Após uma das piores altas na inflação desde o Plano Real, mercado espera que IPCA caia pela metade. O caminho até lá segue cercado de riscos

Da estagnação à incerteza do período eleitoral, a economia brasileira caminha para um ano difícil em 2022. E a inflação, que fechou dezembro como uma das piores desde o Plano Real, seguirá sendo uma adição amarga à lista de problemas dos brasileiros.

Depois da alta anual de 10,06% no IPCA, a previsão do mercado até agora é que o índice fique em torno de 5% neste ano. Isto é, os preços não chegam a cair, mas devem subir menos em várias categorias de produtos e serviços.

Parte da redução contratada vem da economia fraca, com novas altas de juros previstas e projeção de que o Produto Interno Bruto (PIB) tenha crescimento perto de zero no ano.

Ainda assim, o histórico recente do Brasil mostra que há armadilhas inflacionárias mesmo em cenários de crise. “A inflação tende a cair por vários caminhos, até porque a economia está parada. Mas o grande risco é não conseguirmos chegar nestes 5%, pode ser 6%, 6,5%, é uma possibilidade que existe”, diz a economista Juliana Inhasz, professora e coordenadora do curso de graduação em economia do Insper. 

A fila de potenciais vilões é longa. Um dos principais componentes da inflação, o dólar deve seguir acima dos 5,50 reais. Riscos políticos, além do cenário internacional, podem ainda levar a moeda a altas inesperadas.

Na frente dos combustíveis, que subiram quase 50% em 2021, o barril de petróleo vem em queda no mercado internacional. É esperado que a OPEP, organização de países produtores, tenha política mais ampla de oferta neste ano. O preço, no entanto, segue acima de 80 dólares o barril do tipo Brent, e uma chegada aos 100 dólares não é totalmente descartada.

“Ainda estamos muito expostos a fatores geopolíticos inesperados. A própria crise agora no Cazaquistão, importante produtor de petróleo, é um exemplo”, diz Matheus Peçanha, economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas.

A cada vez mais próxima alta de juros nos EUA, que levaria a mais fuga de dólares do Brasil, termina de nublar o cenário. “Parte da inflação é doméstica, mas parte são esses fatores totalmente fora do nosso controle”, diz Peçanha.

Em outro dos destaques da inflação, a energia elétrica, a expectativa é de sinais climáticos melhores após a falta de chuvas que marcou o último semestre e fez os preços subirem mais de 20%. O ano que chega, apesar disso, não está imune a novos contratempos.

“A verdade é que há uma série de questões inflacionárias que não estão resolvidas”, resume Patrícia Costa, supervisora de pesquisas do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).

O saldo que fica

Em boletim de conjuntura publicado no fim do ano passado, o Dieese argumenta que um dos principais desafios para 2022 é o que chama de “herança” dos choques inflacionários dos últimos dois anos.

Parte das altas de preço foi tão brusca que a redução na inflação a partir de agora será insuficiente para gerar melhoria imediata no custo de vida do consumidor. Para este começo de ano, há, ainda, os tradicionais reajustes anuais em preços que costumam ter a inflação como base, ou alta prevista em serviços como as passagens de ônibus.

Embora os alimentos no geral tenham subido menos em 2021, grupos como açúcares e aves e ovos também subiram na casa dos 20% no IPCA.

A cesta básica medida pelo Dieese teve alta de mais de 15% no acumulado anual em algumas capitais. Em novembro, data da última medição, a cesta para um adulto comprometia quase 60% do salário mínimo líquido. “Ou seja, houve uma grande perda no poder de compra da população, porque grupos essenciais subiram muito mais do que 10%”, diz Costa.

Os mais pobres são os que perderam mais, um efeito que se mantém para este ano. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a inflação para os grupos de menor renda ficou na casa de 11%, enquanto foi de 9,7% para a maior fatia de renda pesquisada.

Isso acontece porque parte maior do salário é comprometida com insumos básicos que subiram acima da inflação. Já serviços consumidos pela classe média, como turismo ou educação privada, tiveram variação menor com a pandemia.

Assim, analistas apontam que o maior desafio, do ponto de vista da população, é que a renda ainda sequer acompanhou os aumentos de 2021.

A massa de rendimento brasileira medida pelo IBGE está em queda desde o fim de 2020, após o auge do auxílio emergencial. A taxa de desemprego segue em 12%, com a tendência de quedas somente graduais neste ano.

Caixa Ecônomica Federal, Caixa Econômica, Banco Caixa
Fila para auxílio emergencial na Caixa: efeito da inflação é piorado por rendimento dos brasileiros em queda (Eduardo Frazão/Exame)

Uma característica perversa do desemprego na pandemia é que foram excluídos do mercado de trabalho ou perderam mais renda sobretudo minorias como mulheres, negros e trabalhadores informais, diz o economista Matias Cardomingo, pesquisador do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made), da USP. “É muito nítido como o peso da inflação esteve principalmente sobre os elementos que pesam mais para as famílias de menor renda”, diz. 

Especialistas ressaltam que políticas já conhecidas, como estoque de alimentos e incentivos à agricultura familiar, poderiam ajudar a atenuar parte dos efeitos da inflação para os grupos mais afetados. O Brasil chegou a 19 milhões de pessoas em situação de fome e 117 milhões com algum grau de insegurança alimentar, segundo a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.

“Então, ainda que a inflação seja de 5% em 2022, esse aumento de preços diferenciado [em itens básicos] se combina com um mercado de trabalho que prejudicou especialmente os mais pobres”, completa Cardomingo.

Fim do choque de oferta?

Nos manuais de economia clássicos, uma atividade econômica fraca tende a vir acompanhada de inflação também baixa. O Brasil já desafiou essa lógica em momentos anteriores, sobretudo na crise do fim dos anos 1970 — na época, também piorada por fatores internacionais, como a crise do petróleo.

No cenário de crise da covid-19, a inflação é um desafio no mundo inteiro. Os Estados Unidos chegaram a inflação acima de 6%, e a União Europeia, em 5%, patamares históricos altos. Parte do motivo é o choque de oferta gerado pela pandemia, da falta de semicondutores e outros componentes da indústria a fretes encarecidos e mudança no comportamento dos consumidores.

Mas estes países vivem um contexto relativamente diferente do brasileiro, com desemprego menor e até falta de mão de obra em alguns casos.

Por aqui, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, apontou o cenário internacional como principal desafio para o Brasil, em carta aberta ao ministro Paulo Guedes (a mensagem é de praxe quando a inflação fica acima da meta).

O BC tem promovido sucessivas altas de juros contra a inflação: a Selic, que começou 2021 em mínima histórica de 2%, está em 9,25%. A previsão é que nova alta — que pode vir a ser de 1,5 ponto percentual — seja aplicada na próxima reunião do Comitê de Política Monetária, em fevereiro.

Uma limitação do BC, como reconhece o próprio Campos Neto, é que a inflação tem vindo não da demanda, mas da oferta, o que está fora do campo de impactos diretos da Selic.

Incertezas em Brasília, a falta de sinalizações do governo sobre sua política fiscal e a campanha eleitoral “antecipada” agregam à lista de riscos, com impacto na atração de investimentos e no câmbio. “O Banco Central está atuando praticamente sozinho no controle da inflação, o que dificulta muito”, diz Inhasz, do Insper.

Apesar disso, economistas ainda não batem o martelo sobre se o Brasil já vive um cenário da chamada estagflação, a combinação entre inflação e estagnação.

Na teoria, a economia está em recessão técnica, após duas quedas trimestrais seguidas do PIB. A projeção é de leve alta nos próximos meses, mas, tudo somado, a estagnação é dada como quase certa: no último boletim Focus, a estimativa de crescimento para 2022 (que já foi de 2,5% no passado) ficou em 0,28%.

A expectativa geral, por ora, é que a economia parada terminará de fato puxando a inflação para baixo, ainda que pelos motivos errados.

“Temos queda no preço de combustíveis lá fora, a China fechando um pouco a economia, receios a respeito da ômicron. E, somado a isso, essa inflação de oferta que vemos desde 2020 parece começar a se normalizar”, diz André Perfeito, economista-chefe da corretora Necton, que aponta que muitos dos riscos, inclusive no câmbio, já estão precificados. “Então, a tendência é mesmo de inflação menor — só que com um ano muito ruim na economia.”

O ditado diz que depois da tempestade, vem a bonança. Mas ainda não para o Brasil de 2022.

Fonte: Exame

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