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País trocou uma recuperação mais forte no 3º trimestre por problemas à frente, diz Marcos Lisboa

O presidente do Insper, Marcos Lisboa, avalia que o Brasil herdou um problema para o futuro com as medidas de auxílio adotadas pelo governo para mitigar os impactos da crise provocada pelo coronavírus.

Na avaliação de Lisboa, que foi secretário de Política Econômica no primeiro governo Lula, o país se endividou e perdeu a oportunidade de colocar de pé uma agenda de reformas no momento em que a crise começou a arrefecer.

“Até agora, há uma inação do governo que não diz como é que vai enfrentar esse problema (de piora fiscal). O governo está paralisado. Com esses preços de juros, câmbio, volatilidade, a economia rateia, e as perspectivas para 2021 ficam mais difíceis”, diz Lisboa.

O G1 e a GloboNews ouviram economistas sobre os desafios para 2021. A seguir, os principais trechos da entrevista com Marcos Lisboa, presidente do Insper.

  • Quais problemas?

A grande questão é como o Brasil vai enfrentar a dívida e as restrições que tem. É a parte um do problema. Isso já está prejudicando o país.

O Tesouro não está conseguindo vender papéis da dívida por prazos longos e, portanto, tem de encurtar a dívida. No ano que vem, vai ter um grande problema para rolar essa dívida. E, até agora, há uma inação do governo, que não diz como é que vai enfrentar esse problema. O governo está paralisado. Com esses preços de juros, câmbio, volatilidade, a economia rateia, e as perspectivas para 2021 ficam mais difíceis.

  • O cenário é ruim para 2021, então?

O cenário para 2021 e 2022 é de extremos. Um dos cenários é o governo vir com uma proposta consistente para enfrentar o problema fiscal, de não aumentar gastos. E isso vai dar tranquilidade para os mercados, para o dólar e os juros recuarem. Isso permite a recuperação da economia da grave crise, mas não garante o crescimento de longo prazo.

O segundo cenário é o governo tentar algum atalho para permitir aumento dos gastos e não enfrentar os problemas que nós temos hoje. Nesse caso, o câmbio sobe mais ainda, os juros sobem mais ainda e nós teremos problemas graves na economia em 2021.

  • Como o país sai da encruzilhada do Auxílio Emergencial? É possível um programa social efetivo e que seja fiscalmente responsável?

No meio do ano, uma vez que a recessão estava arrefecendo, o país poderia ter aprovado uma agenda de reformas para começar a enfrentar o problema dos gastos obrigatórios no Brasil. O país gasta muito, e o dinheiro não chega na sociedade. O primeiro problema é enfrentar a questão dos gastos obrigatórios, senão não tem de onde tirar dinheiro.

Segundo, uma agenda de reformas para a economia voltar a crescer. Temos muitos problemas, uma economia fechada, protegida, com distorções setoriais, que desestimula o empreendedorismo, o crédito. Enfrentando esses problemas, a economia se recuperaria da grave recessão, os preços de juros e câmbio não iriam subir como subiram, destoando do resto do mundo.

Com isso, você poderia substituir parte do Auxílio Emergencial pelo emprego, que é a maneira saudável, e desenhar, com os programas sociais já existentes, um Bolsa Família muito mais eficaz e amplo, ajustando o dinheiro que hoje é muito mal focalizado.

  • Criou-se uma armadilha, então?

Essa oportunidade nós perdemos. Não fizemos as reformas necessárias. O cenário para o futuro – a continuar assim – não está bom. Se continuar essa inação, é um cenário ruim. Se o governo tentar aumentar muito o gasto público, sem ter reduzido o gasto obrigatório, vai piorar (a situação do país) no futuro, vai piorar a renda e o emprego. Se o governo tira o Auxílio Emergencial, sem fazer as reformas, é uma economia andando de lado com pessoas desassistidas.

Marcos Lisboa — Foto: Marcelo Brandt/G1
Marcos Lisboa — Foto: Marcelo Brandt/G1
  • No curtíssimo prazo, o que poderia ser feito?

São três pontos. Primeiro, endereçar a PEC Emergencial e o que o governo vai fazer com os seus gastos obrigatórios, qual vai ser a contribuição do governo federal com as suas despesas para poder ter um Renda Cidadã ou um Bolsa Família um pouco melhor. Dois, qual é a estratégia com estados e municípios, porque os gastos não param de aumentar com pessoal e, neste ano, eles tiveram uma folga imensa, com esse auxílio extremamente generoso que o governo federal deu.

E, por fim, vamos finalmente fazer uma agenda para liberar a economia de todas as amarras que nos condenam a esse crescimento medíocre há uma década, como começar a abrir, de fato, a economia, ter privatização, uma reforma tributária que nos aproxime do que o restante do mundo pratica.

  • E a inflação, preocupa em 2021?

Sim e não. Eu acho que o sistema de inflação e a condução da política monetária são temas da política de curto prazo. Isso aí é a gestão do dia a dia da política econômica. O que é preocupante é que nós estamos sofrendo os efeitos dos erros dos problemas estruturais da economia brasileira. Por que o câmbio subiu tanto? Por que o IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado, que reajusta a maioria dos contratos de aluguel) está tão alto?

Nós estamos enfrentando esses problemas porque o investidor está indo embora, o capital está desistindo do Brasil. São empresas fechando os seus negócios no Brasil. Não é de hoje que isso está acontecendo. Isso é grave.

O Brasil é um país muito complicado, as regras são muito incertas, o sistema tributário é caótico. O país está há vários anos, certamente desde o fim da década passada, construindo equívocos que estão custando muito caro e tem tornado o país cada vez mais pobre.

  • Com uma agenda econômica tão clara e necessária, por que as medidas importantes não saem do papel?

Em primeiro lugar, parece que são vários governos. E uma parte importante não quer reforma. Veja a reforma administrativa que foi mandada. Esquece. É um cosmético. Não vai ter impacto relevante. Na discussão da reforma tributária, uma pessoa fala uma coisa, outra pessoa fala outra coisa, alguém diz que não pode.

Na discussão de vários itens, da própria Previdência, o Palácio do Planalto emitiu sinais de que era contra. Eu não sei se esse governo é um governo reformista, não parece ser. Parece ser um governo, pelo contrário, muito alinhado, no fim do dia, aos velhos interesses de corporações no Brasil

  • Com esse quadro, até que ponto dá para ser otimista com o futuro do Brasil?

Eu acho que tem uma notícia boa e uma notícia ruim.

A ruim é que são muitas amarras. E as pessoas, às vezes, imaginam que são três reformas que transformam e tudo se resolve, o que revela que elas não conhecem a complexidade dos problemas do Brasil. Vou dar um outro exemplo: como é que o país vai atrair investimento com o que acontece com as agências reguladoras e com as concessões no Brasil?

Uma pessoa responsável, uma empresa séria, vai querer investir no Brasil no longo prazo? Pegar dinheiro de fundo de pensão de estrangeiros, o dinheiro dos seus acionistas, e colocar num país em que houve controle de preços da Petrobras, intervenção no setor elétrico, mudança da regra do jogo do setor de óleo e gás? Não.

  • E a boa notícia?

A boa notícia é que o Brasil tem uma imensa oportunidade de crescimento. Se a gente conseguir enfrentar cada um desses pontos, a cada pequena batalha ganha, o país cresce. h

Agora, para isso, tem de ter disposição política para enfrentar os grupos de interesse que se beneficiam das distorções, porque elas trazem lucro pra alguém. O país paga um preço caro por elas, mas tem um grupo se beneficiando dessas distorções. Se o governo não tem vontade política de enfrentar, aí fica difícil avançar com uma agenda de reformas.

Fonte: G1

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