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Dasa administra o desafio dos testes para a pandemia

O duplo desafio da Dasa: aumentar os testes e recuperar a demanda perdida

O maior grupo de medicina diagnóstica do Brasil lida com os dois lados da crise da pandemia. De um lado, corre para aumentar o número de testes. De outro, sofre com a redução de até 70% em outros exames.

Muitas empresas foram obrigadas a fechar as portas temporariamente por conta da pandemia. Algumas indústrias, com suas linhas de produção paradas, remanejaram os equipamentos para a fabricação de itens essenciais para enfrentar a pandemia, como máscaras cirúrgicas, conserto de respiradores mecânicos e álcool em gel.

As empresas consideradas essenciais, no entanto, não têm do que reclamar. Supermercados e farmácias, para citar dois exemplos, funcionam normalmente e observam alta na demanda de seus serviços.

Na área de saúde, no entanto, laboratórios e hospitais estão enfrentando um duplo desafio. Ao mesmo tempo em que são pressionados por conta da pandemia, eles sofrem com a redução do número de exames, de consultas e de cirurgias eletivas.

“De maneira geral, o número de exames de medicina diagnóstica caiu em torno de 70%”, diz Romeu Domingues, presidente do conselho de administração da Dasa, em entrevista ao NeoFeed. “A cadeia toda está sofrendo.”

Maior laboratório de medicina diagnóstica do Brasil, com um faturamento de R$ 4,3 bilhões em 2019, a Dasa, dona de marcas como Alta, Delboni, Lavoisier e Salomão Zoppi, está com 40% de suas unidades fechadas por conta da pandemia.

Motivo? Não tem pacientes. “As pessoas estão com medo de ir às unidades e estão deixando de acompanhar as doenças. Esse é também um problema que vamos lidar daqui a dois ou três meses”, afirma Domingues, que é médico de formação.

Para tentar resolver essa questão, a Dasa, que é controlada pela família Bueno, dividiu as unidades por especialidades. Há aquelas que atendem exclusivamente pessoas com sintomas da doença e outras especializadas em pediatria, cardiologia, saúde da mulher, câncer e para pessoas com mais de 60 anos.

Ao mesmo tempo, a Dasa se esforça para aumentar o número de testes em sua rede. A companhia tem capacidade de fazer até 4 mil testes PCR por dia, capaz de detectar a carga viral na secreção respiratória dos pacientes. Os testes sorológicos, que identificam se a pessoa tem a imunidade, são, em média, 5 mil por dia.

A Dasa fez também um acordo com o Ministério da Saúde para criar um laboratório que fará 30 mil testes diários de PCR para pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS). A meta é chegar a 50 mil por dia, aumentando em muito a capacidade de testagem da rede pública.

Esse projeto é um acordo no qual a Dasa não ganha nenhum centavo. A companhia está doando o espaço físico e os profissionais para a realização dos exames. O governo, os equipamentos e os insumos.

Nesta entrevista, Domingues, que também é conselheiro da Ímpar, rede dona de sete hospitais e que está se unindo à Dasa, aborda os desafios do setor de saúde, fala de como reabrir a economia e avalia a ação do governo de federal. Acompanhe:

Como a Dasa está preparada na questão dos testes?
Fomos pioneiros na estrutura privada a validar o teste PCR, que é o estudo genético do vírus (capaz de detectar a carga viral na secreção respiratória dos pacientes). Esse teste é o padrão-ouro, quando você começa com os sintomas. Depois de uma semana a dez dias, a viremia (presença de vírus no sangue) cai. Aí, o PCR deixa de ser importante. E você passa a fazer o teste imunológico para identificar anticorpos. São o IgM e o IgG (testes imunológicos capazes de detectar os níveis de anticorpos), em que também fomos pioneiros. E depois há uma infinidade de testes rápidos. Há vários laboratórios no mundo com testes rápidos. Todo dia tem gente querendo vender. Alguns com “sensibilidade” maior, chegando a 50% a 60%. Outros piores. Mas não é o momento para o teste rápido, pois a curva (de contágio) está na ascendência. E conseguimos fechar uma parceria com o Ministério da Saúde.

Você pode explicar essa parceria?
Eles fizeram um chamamento público. Nós vamos fazer uma doação. Estamos doando a infraestrutura do Centro de Diagnóstico de Emergência, em Alphaville (em Barueri, na Grande São Paulo). E vamos doar também a mão de obra, em torno de 100 a 120 profissionais. Agora, teve outro chamamento para ser feita a coleta e a logística. Esperamos que outros laboratórios privados possam fazer isso também para ajudar para fazer a coleta do material.

Vocês vão participar desse novo chamamento?
Vamos. E se ninguém entrar, vamos entrar sozinhos. Esse não é gratuito. Vamos cobrar. Temos uma planilha transparente do custo de cada coleta, como materiais, itens de EPI (equipamentos de proteção individual), custo de transporte. A ideia é que possamos fazer 30 mil testes por dia de PCR, podendo chegar até 50 mil.

A partir de quando?
Estamos fazendo a obra. Alugamos um galpão em Alphaville. A contrapartida do governo é entrar com os equipamentos e com os insumos. A ideia é que comece a fazer exames em até quatro semanas. Depende dos insumos e dos equipamentos chegarem e de definir o processo de coleta, pois o chamamento acabou de acontecer. É uma administração diária. Daqui uma semana vão chegar 15 mil reagentes para fazer o PCR. Mas vai que a China atrasa ou entrega pouco. É uma briga global pelos aparelhos e pelos reagentes. Então, você não tem certezas. Se chega um contêiner enorme de reagentes, você libera e se programa para os próximos. É dinâmico e estressante.

“É uma briga global pelos aparelhos e pelos reagentes. Então, você não tem certezas”

Hoje, a capacidade da rede privada da Dasa é de quantos exames por dia?
Estamos com capacidade, dependendo dessas variações, de 3 mil a 4 mil PCRs por dia. E para o sorológico (IgM e IgG), de 5 mil por dia.

A Dasa irá fazer 30 mil por dia para a rede pública. É suficiente?
O governo quer fazer 10 milhões de PCRs. É um esforço. Está todo mundo brigando por testes. Dá para imaginar que Nova York não testou? Dá para imaginar que os EUA não tinham um teste aprovado? Uma coisa que estamos aprendendo com a crise é que não podemos negligenciar a ciência. Estávamos preocupados com o preço do petróleo, a briga dos EUA com a China e a ciência ficou negligenciada no mundo inteiro.

A Dasa está priorizando algum grupo específico nesses exames?
Quando começamos a fazer o PCR, validamos para os hospitais. Eram para as pessoas que procuravam as emergências com sintomas. E também para a coleta domiciliar. Não queríamos que o paciente fosse até as unidades infectar os demais. Agora, estamos abrindo algumas unidades preparadas para fazer a coleta para a pandemia. E continuamos fazendo a coleta domiciliar e os exames para hospitais. Além disso, abrimos algumas unidades especializadas em pediatria, cardiologia, saúde da mulher, câncer e pessoas com mais de 60 anos. As pessoas estão com medo de ir às unidades e estão deixando de acompanhar as doenças. Esse é também um problema que vamos lidar daqui a dois ou três meses. Caiu o número de exames, de consultas e de cirurgia eletivas. O que dá para entender. Mas esse é mais um lado ruim da crise.

Você tem ideia de quanto caiu esses outros tipos de exames?
De maneira geral, o número de exames de medicina diagnóstica caiu em torno de 70%.

“De maneira geral, o número de exames de medicina diagnóstica caiu em torno de 70%”

De um lado, a Dasa está altamente pressionada para fazer exames para detecção do vírus. E de outro, há uma subdemanda.
Isso. Estamos com uma subdemanda, com vários colaboradores em casa. Então, é complexo. A cadeia toda está sofrendo. Os hospitais, de uma maneira geral, estão sofrendo para se preparar para a pandemia e estão fazendo muito menos cirurgias eletivas. O tíquete médio do paciente infectado é bem mais barato, pois é um caso clínico. Não estou falando de quem está no CTI (Centro de Terapia Intensiva). Mas a maioria que está internada é um caso clínico, muito mais barato que uma cirurgia. Os hospitais também perderam receita pela diminuição de cirurgias eletivas. Temos também mais gastos com EPIs e com os colaboradores afastados. É difícil.

Quantas unidades da Dasa estão fechadas?
Temos 40% das unidades fechadas.

Por que estão fechadas?
Por falta de paciente.

Quer dizer que no meio dessa crise toda, vocês vão ter perda de receita?
Todo mundo vai ter.

E com aumento de custos e gastos?
Com aumento de custos em relação a EPIs e a funcionários afastados. A situação é bastante complexa.

Como a Dasa se organizou desde o começo da crise para enfrentar essa pandemia?
Foi criado um comitê de crise da Dasa e da Ímpar. A gestão de uma pandemia é dinâmica. Muda toda hora. Criamos um centro de comando, com vários dashboards para você acompanhar internação, UTI, material de consumo, insumos, índice de alta, índice de mortes, índice de exames. Temos isso quase que em tempo real. A gente se preparou para ter os EPIs. Nos preparamos para comprar os respiradores para poder até dobrar a capacidade de leitos de UTI na Ímpar. Fomos pioneiros em fazer o PCR. Fomos pioneiros nos testes sorológicos.

“Foi criado um comitê de crise da Dasa e da Ímpar. A gestão de uma pandemia é dinâmica. Muda toda hora”

O que mais foi feito?
Como uma empresa de saúde precisamos pensar também no lado social. Abraçamos essa parceria com o Ministério da Saúde. Estamos investindo um bom dinheiro nisso. A Ímpar também fez parceria com a Amil e a Rede D’Or para criação de 110 leitos no Rio de Janeiro. Estamos ajudando um hospital de campanha em Duque de Caxias. Eu pessoalmente me engajei numa campanha para arrecadar recursos com empresários, num movimento chamado União Rio. São muitas pessoas físicas e pessoas jurídicas com o objetivo de comprar 50 leitos para o Hospital Universitário, do Fundão. E foi bacana. Em menos de uma semana, arrecadamos R$ 10 milhões. E ainda continua entrando dinheiro. Os 50 leitos viraram 60. E agora estão virando 78. E também teve uma doação para o governo do Distrito Federal.

Quanto a Dasa está gastando?
Não temos ainda uma estimativa. É um balanço que no final vamos ter. Mas são milhões.

A gestão dessa crise na Dasa é diária, não?
Sim, é uma gestão diária. É sábado, domingo, feriado. O pessoal está trabalhando muito.

Você pode dar exemplos?
Quando eu abri os testes PCRs para as unidades privadas, comprei um contêiner de reagentes da China, estava para chegar no dia tal. Ele estava pago. E o contêiner não veio. Um hospital que está com 95% dos leitos de UTIs ocupados e eu tenho de fazer a segunda onda. Tenho de pegar mais 30 leitos que não são de UTI e virar UTI. Então, isso é tudo dinâmico. E fora médico ligando, pedindo exame. O hospital ligando, querendo saber o que você vai priorizar. As pessoas não entendem que têm de priorizar quem tem sintoma, não pode ir fazendo (testes) em todo mundo, por enquanto. É exaustivo.

A maioria dos funcionários da Dasa está na linha de frente no combate dessa pandemia. O que tem feito?
Aumentamos o treinamento e o padrão de higienização das unidades. Tem a questão das EPIs. São protocolos mais rigorosos, delineados pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e pelo Ministério da Saúde.

Como você tem avaliado a atuação do governo federal nessa crise da pandemia?
Vou falar como cidadão e como médico e não como presidente do conselho da Dasa. Eu acho que o governo tomou medidas corretas. Seguiu a orientação da OMS, com isolamento social. Onde isso foi feito de forma precoce funcionou. Até mesmo nos EUA. O vírus chegou lá primeiro na Califórnia. A Califórnia fez o dever de casa e teve muito menos óbitos. Nova York não se preparou. Os EPIs demoraram para chegar, mas chegaram. Então, acho que o saldo é positivo.

E como você avalia a troca do ministro da Saúde no meio da pandemia? E qual a sua avaliação do novo ministro?
De novo como Romeu. O ideal é que não tivesse tido a troca. O ideal é que continuasse aquele trabalho. Era uma equipe muito qualificada. Mas aconteceu. Isso é inerente. O bom disso é que o Nelson Teich (novo ministro da Saúde) é competente. Conheço ele bem. É qualificado. Foi um grande oncologista, um grande gestor privado, empreendedor. Depois vendeu sua clínica, continuou estudando, fez pós-doutorado na Inglaterra. É um cara muito culto e não é político. Ele tem muitas qualidades. Foi uma escolha feliz.

“O ideal é que não tivesse tido a troca. O ideal é que continuasse aquele trabalho. O bom disso é que o Nelson Teich (novo ministro da Saúde) é competente”

Os testes sorológicos, que verificam se as pessoas estão imunes ao vírus, são uma alternativa para abrir a economia?
É uma combinação. Agora, que a curva está subindo, é muito PCR. Depois, com a curva descendo, são os testes sorológicos e os testes rápidos. Aí você consegue desenhar o mapa da imunidade. Com 30% a 40% de pessoas imunizadas, temos a chamada imunidade do rebanho. Aí, você pode ir liberando, porque certamente esses 30% já tiveram contato com os outros 70%. Uma coisa que foi feita com sucesso na Coreia do Sul associada aos testes de larga escala foi o rastreamento das pessoas infectadas. Você precisa fazer muitos testes e usar plataformas como aplicativos e inteligência artificial para fazer o rastreamento. Seria ideal.

Dá para imaginar quando o Brasil terá a imunidade do rebanho?
É difícil. É como eu te dizer qual será o valor do dólar. Acredite-se que o pico vai estar em torno da terceira ou quarta semana de maio. Isso são estimativas. A doença começou nas classes A e B. E agora está avançando para as cidades menores e indo para as classes C e D. Temos ainda muitos desafios pela frente.

E quando você acredita que se consegue voltar a um mínimo de normalidade?
Difícil a resposta. Ela varia por regiões. É muito heterogêneo. De repente, uma cidade do Sul, como um alto nível de IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), como Joinville, consiga sair mais rápido. E, por outro lado, você tem o oposto, como Manaus, com IDH mais baixo e que não tem bom suporte de saúde. É difícil de responder. Não pode ser uma coisa assim: ‘a partir de dia 10 de maio, o Brasil inteiro libera’.

Tem de ser caso a caso?
Eu acho que caso a caso. E começar como fizeram outros países, como Alemanha e Suécia. Primeiro, libera as escolas, as crianças que adquiriram imunidade e que não têm contato com os idosos. Depois libera algumas atividades de varejo, mas usando máscara e não deixando aglomerar. Libera restaurantes, mas com menos mesas. De novo: não tem consenso científico de como vai ser o relaxamento É trial and narrow.

Bill Gates, que é um dos empresários mais engajados nessa questão da pandemia, escreveu um artigo dizendo que a vida só volta ao normal quando tiver uma vacina.
A vacina nos dá um alento. O que também não sabemos é se a imunidade que você adquire é duradoura. São muitas interrogações ainda.

“Vamos ter uma fase no mundo inteiro muito dura, de mais desemprego, mais alcoolismo, mais violência familiar, mais suicídio”

Como vamos sair dessa situação?
Acho que vamos sair dando mais valor a coisas como saúde, família e amigos. Vamos sair mais digitais. Vamos sair mais solidários. Por outro lado, vamos ter uma fase no mundo inteiro muito dura, como estamos agora, de mais desemprego, mais alcoolismo, mais violência familiar, mais suicídio. Estamos tendo de sair menos de carro, tem menos assalto, menos mortes por bala perdida. O lado pior, não só de perdas de familiares e amigos, são as pessoas que estão tendo muita dificuldade financeira e com depressão. É um momento muito duro.

A sua visão não é muito otimista.
Eu acho que vamos sair melhores como pessoas. Mas, no curto prazo, de seis meses a um ano, vão ser dias duros para todo mundo.

Fonte: https://neofeed.com.br/blog/home/o-duplo-desafio-da-dasa-aumentar-os-testes-para-a-covid-19-e-recuperar-a-demanda-perdida/

Foto: Romeu Domingues, presidente do conselho de administração da Dasa

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